quarta-feira, 4 de setembro de 2013

A Compaixão na intervenção psicológica


Ao ler o nosso blog, deparei-me com o texto da colega Eneida, que me deixou a pensar nesta mudança de paradigma sobre a qual ela nos questiona…

Os conceitos orientais invadiram, inegavelmente, várias áreas do conhecimento ocidental, e tornaram-se (quase) uma moda, para o bem e para o mal. Mas concordo com a Eneida, que nos faz pensar sobre a utilidade, neste caso, de muitos dos conceitos vindos da filosofia budista. De facto, tenho vindo a perceber que, como defende Dalai Lama (2003): “O budismo e a ciência não são perspectivas conflituosas sobre o mundo e sim diferentes abordagens para o mesmo fim: a busca da verdade […] expandindo o nosso conhecimento e compreensão.”

Para mim, um dos conceitos inspirado na filosofia budista que me parece poder ser um grande contributo para a prática da Psicologia (e para a intervenção na área social em geral) é o conceito de compaixão. De facto, se o sofrimento é uma experiência inerente à condição humana, bem como as nossas tentativas de o cessar, o que poderemos fazer para escapar à “ignorância” que a Eneida refere e que nos mantém neste ciclo vicioso de mais sofrimento (ou dukka, também traduzido como doença…) sempre que procuramos sair dele?

A propósito, escreve Gilbert (2009): “A compaixão (que é um componente do loving-kindness) envolve estar aberto ao sofrimento de si mesmo e dos outros, de uma forma não defensiva e não crítica. A compaixão também envolve um desejo de aliviar o sofrimento, cognições relacionadas com a compreensão das causas do sofrimento, e comportamentos – agir com compaixão. Assim, é da combinação de motivos, emoções, pensamentos e comportamentos que a compaixão emerge. […] Todos os seres sensitivos procuram estar livres de sofrimento. Contudo, muitas das nossas formas de tentar reduzir ameaças e alivar o nosso próprio sofrimento e angústia, tais como buscar o amor/aprovação de outros humanos, fama, glória, sexo ou saúde podem oferecer-nos apenas um conforto temporário (todas as coisas são inconstantes). Mais que isso, podem deixar-nos ainda piores na medida em que podemos vir a desejá-las, temer a sua perda ou, na sua busca, podemos distorcer o nosso sentimento de self e criar inveja e sofrimento nos outros. Buda argumenta que “tornar-se iluminado” e criar um estado interno de “estar numa felicidade pacífica” seria ver para lá destas “ilusões e aflições” através do treino da mente. Cultivar o loving-kindness e a compaixão por si mesmo e pelos outros seria um caminho para a libertação do sofrimento para todos.” 

Se por um lado, por inúmeras variáveis, o ser humano mostra frequentemente a sua tendência para a crueldade e agressividade, é igualmente verdade que a afiliação, o cuidado, a empatia e a compaixão parecem ser tão ou mais uma tendência natural dos seres humanos. E parece que as evidências apontam cada vez mais nesse sentido (e.g., http://visao.sapo.pt/estudo-mostra-que-cerebro-nao-distingue-o-eu-do-outros=f746771).

Não sei se abraçar estes conceitos representa a mudança de paradigma sobre a qual a Eneida nos questiona, mas faz-me muito sentido que a aceitação compassiva da experiência, sem crítica nem julgamento, possa minimizar muita das nossas angústias que, na sua maioria, têm a sua raiz num passado que não conseguimos mudar ou num futuro que não podemos controlar… Resta-nos o presente, por isso, sejam compassivos … J

 

Marta Capinha

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